UM GOLE DE IDEIAS

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.: Um Gole De Ideias :. -> Dois anos no ar!

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domingo, 28 de março de 2010

A NECESSIDADE FEZ UM POETA


Dentre prosas velejo por mares tão distantes, tão abstratos e fantasiosos quanto qualquer insensatez do LSD ou chá do Santo Daime. Prosear deixa-me próximo de uma liberdade imensurável, em contraposição aos atraentes braços fúlgidos, entretanto limitantes da poética. Não há nada melhor do que jogarmos conversa fora com nós mesmos, escrevermos o livre pensar sem redomas de expressão!


A poesia recebe muitos gracejos, ela é meticulosamente delineada, sendo sempre vangloriada por isso. Ela é até um tanto intocável devido isso: obra do divino saber, condescendente às emoções.


Eu caminho na solidão, sou apenas acompanhado pela prosa. Gosto dela por ser intempestiva, pois não preciso de motivos e nem que esteja em momento propício à produção: amores e dores não alimentam minhas estrofes, apesar de preencherem muitos versos insinceros. Melhor confessar, leitor, que minhas jornadas em prosas não são tão solitárias: logo surgem diversos personagens que retratam os mais diversificados “eus” do deus que os redigiram. E monotonia não há: eu-líricos de todas as formas chegam a travestirrm o gênero do narrador-personagem ou até mesmo personificarem um objeto inanimado, como a minha caneta (a Caneta). A cada prosa um novo mundo nasce. A cada mundo criado e compartilhado através da leitura, novas ideias fervilham para o nascimento de outras obras semi-divinas.


Eu sou assim: universo de prosa. Ainda assim, não me distancio da estética, percorrendo numa complexa rede de palavras que provocarão êxtase, mas que só farão sentido num generoso contexto. Eu sou prosa desde os tempos da Caneta Bic, hoje quase extinta por causa dos teclados afoitos. Por amores, porém, tive que me aventurar na poesia, desbravando o léxico para encaixar as peças desse jogo fugaz: as sílabas métricas e as rimas. Eu não era muito feliz! Olha uma das que eu escrevi ainda no colegial:


“Foi paixão o que o meu corpo sentiu

quando pouco estive em sua presença.

ou apenas uma ilusão tangente

à uma inocência repleta de esperança?


Queria ao menos sua boca tocar,

tirar a prova real pelo físico,

saber pelo teu gosto o que é se apaixonar

ou apenas alimentar um coração fraco.”


Nossa! Esse poema foi desenterrado, creio ser melhor não terminá-lo? “Prova real, Tangente”... Talvez se fosse a professora de matemática quem tivesse iludido a minha inocência repleta de esperança, talvez até fosse um poema inteligente. Apesar de não ter valor estético essas grandes frases apenas fragmentadas. O fato é: acho que eu nem sabia o que significava tangente, apesar de ter se encaixado tão bem. E talvez eu nunca tivesse “esperança” alguma, se esta palavra cheia de significado não rimasse com “presença”. Percebe o engessar da minha poesia? Você acaba navegando para um discurso que não te pertence e naufraga em emoções um tanto mais aquém ou além da sua real expressão. Quantas pessoas já não recitaram “amar” só porque esta palavra é tão fácil de rimar?


Você deve está pensando agora: “aonde ele quer chegar com isso?” Devo não mais prolongar esse texto e logo me explicar.


Simplesmente o tempo foi passando... Tentava através da poesia conquistar ou manter meus relacionamentos. Amores vários nasceram forçados pela minha rima poética, mas logo se acabavam, deste modo mais versos deveriam ser criados para novas conquintas. Foram muitas conquistas! Claro, que muito menos do que tentativas amorosas falhas. E foi assim que a necessidade fez-me poeta. Tudo bem que eu era um free-lancer de mim mesmo: escrevia para meu alterego conquistar paixões. Mas, não é que juntando todos os meus poemas eles renderiam um livro (mais pela quantidade do que pela qualidade)? Uma editora aceitou o meu projeto “Ensaio de um poeta vivo”, antes de aceitarem as minhas prosas cheias de liberdade de expressão e conteúdo.


Enfim, veio a publicação do meu livro de poesia, diria o meu primeiro ensaio como escritor profissional, contudo não sabia se alguém, além da minha mãe e minhas tias solteironas, o compraria. Mas compraram... e muito! E hoje em dia a poesia faz parte do meu trabalho: com as vendas a editora me pressionava para novas publicações e começaram investir no meu nome. Queria ter dado certo com os meus romances, porém a editora ainda não acreditava neles e falavam: “vamos dar um tempo pro seu nome se estabelecer”. Claro, chegaria um determinado momento que as pessoas comprariam até literatura de cordel escrita no papel higiênico de um renomado - e essa sempre foi a minha grande crítica.


Hoje conquistei a almejada fama. Sou convidado para participar de muitos eventos sociais e blá. O lado bom disso é que ganho um bom dinheiro, apesar do meu engendramento literário. Mais sabe o que é o mais legal disso tudo? É que os poemas que antes foram fracasso nas minhas conquistas (a grande maioria delas), hoje conquistam inúmeras pessoas.

terça-feira, 23 de março de 2010

A lenda do menino sem deus


Diziam eles que havia, no antigo bairro de Santos Dummont, um menino franzino que orava em línguas. A novidade não se dá pelo fato de um garoto pronunciar palavras aleatórias que voam boca a fora, e sim por se tratar do objeto de fé que atua em inúmeros milagres comprovadamente grandiosos. Os pais dele, orgulhosos que só, ostentavam a criança nos cultos agitados do vilarejo. A ideia de milagre parecia tão palpável que a própria mãe do menino passou a entoar as orações enquanto conversava com ele sobre as coisas cotidianas – um cotidiano de dias contados, aliás, a essa altura. O tiraram da escola a contragosto do próprio menino, diziam os pais que ele devia se dedicar às missões que o foram confiadas.


A igreja, o pastor, os vizinhos, os pais, e os irmãos, todos eles ganharam brio. O menino era olhado com grande curiosidade até pelos mais céticos vizinhos, talvez por reconhecimento da atual fama... Talvez! Digo a vocês que perceberiam a grandeza do menino só de olhar de canto de olho, e ainda que as palavras entoadas por ele eram mesmo de um tom divino. O pastor passou a pedir mais a contribuição do menino nos momentos de reflexões nos cultos. Vale perder um pouco mais de linhas descrevendo a cara do menino após esse tipo de chamado em dado momento da celebração. O menino quase sempre se desprendia da mãe com facilidade e obstinação; tinha passos firmes a caminho do altar/palco; delicadamente entreolhava o chão e o público com olhos semisserrados, espalmava uma das mãos enquanto a outra tocava o peito, e permanecia assim até atingir as palmas e os olhares contemplativos; voltava ao acolhimento fraterno sem muita cerimônia e, calado, esperava ansiosamente o amém derradeiro.


O chamavam para entrevista na rádio... O único jornal de circulação local pedia declarações... Mas os pais/assessores tratavam logo de dissipar o tormento da modernidade. O menino comia, se enclausurava no quarto, ora falava com um dos irmãos ora recebia alguma visita desesperada. A essa altura, caros fiéis, o menino se questionava sobre a verdade das coisas, observava vagamente o horizonte restrito que a sua janela o permitia, e aspirava à liberdade de viver além das rédeas de suas próprias atitudes – uma espécie de culpa que nem mesmo ele conseguiria nomear, isto faço eu agora.


Certa vez os pais permitiram a visita de uma antiga amiga do menino, dos tempos da escola. A menina também frequentava a mesma igreja, mas, ao contrario dele, ainda ia às aulas regularmente. Ela adentrou o claustro com passos silenciosos e encontrou o menino debruçado no parapeito da janela. Ele a recebeu com muita festa e ela imediatamente o deu um grande abraço. As perguntas infantis foram se sucedendo até que... “como é essa coisa de falar em línguas?” O menino sentiu que era demasiado perigoso responder àquele questionamento, porém pensou também que não exercia poder divino nenhum diante daquela menina. As palavras dele rodeavam o assunto sem muito dizer, mas a insistência da garota dos porquês resultou numa suspeita quase que inevitável. A jovem ainda tinha porquês pra uma tarde inteira, mas logo a interromperam com um grito vindo da cozinha: “Já é quase hora do jantar, Sofia!” significa: hora de ir pra casa. Eles se despediram e o menino voltou à janela com gosto de maça na boca. Dividiu com a doce menina o código da santidade e acabou por invalidar o solitário bem egoísta de ser deus.


Ouvi falar num tal menino que viu a vida da janela de seu quarto. Pouco sabem de sua infância e adolescência, pouco investigam sobre isso também. Diziam as más línguas que era um ateu nato, mas a sua volta foi deus declarado. Da vontade dele pouco dizem também tampouco da eternidade que reside além do horizonte da janela. Tenho pra mim, que conto agora essa história, que a realidade dele ainda sofrerá algumas alterações.



sábado, 13 de março de 2010

AGORA EU TENHO UM CORAÇÃO



Rancor, medo, ódio... nada disso possuo. Sou um homem de ferro, melhor dizer, uma coisa de ferro. Ainda assim, quando desejo, não há ninguém que possa me persuadir a não concretizá-lo. O que quero agora? Um coração. Mas quero um bem novo, longe dos entraves da vida adulta ou das moléstias da senescência. Além disso, quero um coração distante dos sentimentos malignos que assolam o homem.


Andei vendo muito aquela caixa que fala, talvez seja televisão o seu nome, e aprendi que, no final, o bem é superior - apesar de sempre sair-se mal na maior parte do tempo. Aprendi, também, que apenas no coração jovem se habita a inocência, bem longe do mal. Porque falo disso? Quero ser bom, mas antes preciso apenas ser. Pois existo num vazio... Vagando em minhas ações que não têm sentido, pois estão mortas. Nem morto posso estar, porque simplesmente não possuo o dom da vida!


Minhas irmãs, moças para quem sirvo, dizem me amar. Ainda nem entendi o que é isso, mas elas falaram que, por causa disso, fariam qualquer coisa por mim, que dariam mesmo as suas vidas por/pra mim. Nunca fiz nada para merecer isso, apenas vago no existir, cumpro os comandos que o Pai determinou.


O Pai foi trabalhar hoje cedo e disse: “cuide bem das minhas filhas”. Senti um aperto incompreensível no meu peito. Segundo a caixa, isso seria psicogênico, mas tão tenho coração, tampouco alma. Então, porquê sentir algo? Só sei que percebi que as irmãs eram muito significativas para o Pai, bem mais do que sou. Devoto tanto ele, mas as irmãs sempre mencionam o odiar. O Pai as proíbe de algumas coisas afirmando ser para o bem delas, mas elas nunca se conformam. Também não entendo o por quê do Pai as amar tanto. Claro que sei: elas têm um coração.


Uma frase ecoa: “fariam qualquer coisa por mim”... Como num filme da caixa, peguei o machado do Pai e fui ao encontro dos jovens corações. Elas diziam: “O que vai fazer? Não faça isso! Está louco!” Mas minha loucura era saber se aproximar do que o homem tem de racional.

Os corpos inanimados das irmãs sobre as poças de líquido vermelho me parecem tão belo. Pai deve ficar orgulhoso de mim. Agora EU tenho um coração, um não, dois. Agora o Pai vai me amar mais do que tudo ou todos.


Na minha mão vejo o precioso órgão. O que os sábios diziam guardar a vida, mas me parece tão morto. Ele não é de perto tudo o que falam, mas agora possp sentir coisas estranhas... Algo escorre dos meus olhos e parece alguma coisa deu errada. Vou ao encontro das minhas irmãs. Elas estão mortas e eu não consigo me controlar: sofro pela primeira vez. Sinto uma dor imensa no meu peito, nos meus novos corações. O Pai não vai gostar nada disso! Agora já é tarde demais, com o arrependimento eu vou viver com a esperança de um dia a morte me aliviar.


sexta-feira, 5 de março de 2010

Filhos da democracia

Perturbado pela atual cena política nacional, faço uma pergunta: o que está acontecendo com a geração anos 90? Incluindo-me na mesma, sou de 1988; nascemos praticamente juntos com a instauração da democracia no Brasil, o sonho tornara-se realidade, o país estava livre, finalmente, e nós, nascemos livres. Esta pergunta surgiu de uma constatação óbvia, futuramente a nação será governada por nós. E o que faremos? O que temos a oferecer? Tenho certeza que não ofendo ninguém ao dizer que minha geração tornou-se a geração sem-educação, quando deveria ser o oposto, visto que o acesso à educação - do básico ao superior - é bem amplo. Curso Letras na faculdade, serei professor e imagino um aluno me mandado tomar no c*, porque o repreendi ou lhe dei nota baixa. Mas como, se meus futuros alunos nasceram, em sua maioria, na geração 2000? Esses terão acesso praticamente ilimitado à informação, cultura e educação. Mas infelizmente herdarão o que nós deixaremos.


O cenário político-social do início dos anos 80 foi marcado pela luta de nossos pais para que o país saísse da era negra da ditadura militar e entrasse na iluminada era democrática. Muitos foram presos, torturados e mortos, mas conseguiram alcançar seu objetivo porque acima de tudo, acima da dor e da humilhação, tinham um ideal. Vieram de uma geração confinada, em que a única opção era a opção “a”, que o governo lhes dava. Mas com o idealismo que os movia e os motivava a seguir em frente, lutaram bravamente para que seus filhos, para que nós pudéssemos escolher uma opção “b”. Às vezes, chego a pensar que o idealismo morreu junto com o velho Tancredo, o primeiro presidente eleito democraticamente... Enterraram a arma que usaram para concretizar seu objetivo, como se não houvesse mais batalhas a ganhar. Nossos pais empenharam-se tanto para termos o que eles não tiveram que se esqueceram de nos dar o que eles tiveram: idealismo e coragem para que fôssemos uma geração forte, educada e consequentemente, extraordinários seres humanos e líderes em quaisquer áreas de atuação.


Invejo meus pais... nasceram da geração sem esperança e na marra tornaram-se a geração idealista, a geração ideal! E eu, e nós, geração anos 90, futuros líderes, filhos da democracia e agimos como anárquicos, seguimos nossas próprias regras porque nada mais importa a nós do que nosso próprio umbigo. Um brinde a nós, filhos da anarquia democracia!
Ontem o presidente Tancredo faria 100 anos, morreu em 1985... o ano da morte do idealismo.
Por fim, deixo registrado aqui, meu apelo: Exumem Tancredo Neves!

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